"The gratuitousness of justice in the context of the labor reform Revista de Direito do Trabalho | vol. 197/2019 | p. 57 - 82 | Jan / 2019 DTR\2018\22768" - por André Araújo Molina
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Resumo: O artigo busca desvendar a forma, o objeto, os requisitos e os sujeitos do direito fundamental à assistência jurídica integral e gratuita, previsto na Constituição Federal de 1988 e, atualmente, regulamentado, no processo do trabalho, pela Lei 5.584/1970 e pelo capítulo próprio da CLT, com os ajustes realizados pela reforma trabalhista (Lei 13.467/2017), bem como pela aplicação, no que couber, do CPC de 2015 e da Lei 1.060/1950, com especial atenção aos efeitos da sua concessão aos trabalhadores sucumbentes em custas e honorários advocatícios e periciais.
Palavras-chave: Reforma trabalhista – Justiça gratuita – Ônus financeiro Abstract: The article seeks to unveil the form, object, requirements and subjects of the fundamental right to full and free legal assistance, provided for in the Federal Constitution of 1988 and currently regulated in the labor process by Law 5,584/1970 and by the chapter itself of the CLT, with the adjustments made by the labor reform (Law 13,467/2017), as well as for the application, where applicable, of the CPC of 2015 and the Law 1,060/1950, with particular attention to the effects of its concession on workers succumbing in costs and fees, attorneys and experts.
Keywords: Labor Reform – Free Justice – Financial Burden
Sumário:
1.Introdução
2.Evolução histórica dos institutos
3.A justiça gratuita no processo do trabalho atual
4.Efeitos da gratuidade para a parte sucumbente em honorários advocatícios e periciais 5.Recolhimento prévio das custas para a repropositura da ação anteriormente arquivada 6.Conclusões - Referências bibliográficas
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1.Introdução
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 5o, XXXV, elenca como um direito fundamental dos cidadãos o acesso à justiça. E, para que não seja a garantia apenas formal, exige do Estado a prestação da assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos, conforme previsão do inciso LXXIV do mesmo artigo, gênero que engloba a gratuidade da justiça (custas e despesas) e a assistência jurídica e judiciária (auxílio técnico, preferencialmente oferecido pela Defensoria Pública e, subsidiariamente, pelas instituições oficiais de ensino superior jurídico e pelos advogados nomeados), na forma em que a lei especificar.
As antigas legislações que tratavam a respeito do tema, regulamentando a forma, o objeto, os requisitos e os sujeitos do direito fundamental à assistência jurídica integral e gratuita, foram todas recepcionadas pela atual Constituição – a exemplo da Lei 1.060, de 1950 (LGL\1950\1), da Lei 5.584, de 1970 (LGL\1970\8), e do capítulo próprio da CLT (LGL\1943\5) –, contudo, recentemente, com o advento do Código de Processo Civil de 2015 e da Lei 13.467, de 2017 (LGL\2017\5978), conhecida como “reforma trabalhista”, diversos ajustes de forma e fundo foram realizados, alcançando os processos da jurisdição especial, que passaram a sentir as mudanças no tema da gratuidade da justiça.
Nesse contexto, o objetivo principal do presente artigo é o de descrever o ordenamento jurídico atual quanto à justiça gratuita, nos limites do processo do trabalho, notadamente tendo em mira as mudanças trazidas pela reforma trabalhista, que alterou diversos dispositivos da CLT (LGL\1943\5), bem como alguns dispositivos do CPC (LGL\2015\1656), de 2015, que são incidentes de forma subsidiária e supletiva.
2.Evolução histórica dos institutos
A redação originária da CLT (LGL\1943\5) dizia, no art. 789, que as custas deveriam ser calculadas e pagas antes da decisão, mediante selo federal aposto aos autos, nas Juntas de Conciliação e Julgamento, ou pagas no ato da distribuição, nas hipóteses de atuação jurisdicional delegada dos Juízos de Direito, não havendo previsão de gratuidade da justiça para os necessitados, muito menos de assistência judiciária.
Poucos anos depois da sua vigência, por intermédio do Decreto-Lei 8.737, de 1946 (LGL\1946\12), fora alterada a redação do § 4o e incluído o § 7o no citado art. 789, passando a prever que as custas seriam pagas ao final, após o trânsito em julgado da decisão, invertendo-se a lógica anterior da sua antecipação pelo autor da ação; nasceu também a previsão de que os presidentes dos tribunais do trabalho teriam a faculdade de concederem, inclusive de ofício, os benefícios da justiça gratuita àqueles que percebessem até o limite de dois salários mínimos e ainda aos que provassem o seu estado de miserabilidade econômica. Ou seja, a partir de 1946 o autor da ação trabalhista não precisaria mais fazer o pagamento antecipado das custas, assim, se condenado ao final da ação, poderia delas ficar isento, se beneficiário da justiça gratuita, bastando, para tanto, comprovar o recebimento de até dois salários mínimos, com presunção legal de miserabilidade nessa hipótese, ou demonstrar, mesmo que recebesse patamar superior, que não se encontrava em condições de arcar com as despesas do processo.
Passados mais alguns anos, entrou em vigor a Lei 1.060, de 1950 (LGL\1950\1), para regular a assistência judiciária aos necessitados, de forma genérica para a jurisdição comum, e algumas de suas disposições passaram a ser aplicadas ao processo do trabalho, de forma subsidiária, naquilo em que a Consolidação não tinha tratamento legislativo próprio, com a permissão do art. 769 da CLT (LGL\1943\5).
A assistência jurídica integral e gratuita, no processo do trabalho, para além da mera isenção de custas e demais despesas, somente foi regulamentada pela Lei 5.584, de 1980, que determinou que o amparo deveria ser prestado pelo sindicato da categoria, mediante advogado recrutado e indicado por este, tendo garantia de remuneração os honorários assistenciais a serem fixados pelos juízes nas ações em que funcionar, sendo que apenas na ausência do advogado sindical é que atuaria, de forma complementar, a Defensoria Pública e os serviços dos estabelecimentos de ensino superior jurídico (escritórios-modelo).
Até que, no ano de 2002, por intermédio da Lei 10.537, o art. 789 da CLT (LGL\1943\5) foi novamente aperfeiçoado, consolidando a diretriz de que as custas deveriam ser pagas pelo vencido, após o trânsito em julgado da decisão, ressalvando que nos casos de recurso, as custas seriam pagas e comprovadas dentro do prazo recursal, com exceção dos beneficiários da justiça gratuita. Na forma do novo art. 790, com a redação dada pela mesma lei atualizadora, facultou-se aos juízes a concessão, a requerimento ou de ofício, da gratuidade da justiça, inclusive quanto a traslados e instrumentos, aos que percebessem até dois salários mínimos ou que declarassem que não estavam em condições de pagar as custas, sem prejuízo do sustento próprio ou da família, entendendo a jurisprudência pacífica do Tribunal Superior do Trabalho que a declaração de insuficiência financeira poderia ser feita pelos próprios advogados dos litigantes e sem a necessidade de poderes especiais para tanto.
A CLT (LGL\1943\5) não cogitava da suspensão da exigibilidade das custas e despesas aos beneficiários da justiça gratuita, como previsto na Lei 1.060, de 1950 (LGL\1950\1), até que a parte adquirisse, no futuro, condições de satisfação, mas de sua completa isenção, alcançando inclusive os honorários periciais (art. 790-B da CLT (LGL\1943\5)), ocasião em que se consolidou na prática processual especializada, na quase universalidade dos casos, a completa dispensa dos encargos financeiros para o ajuizamento e a propulsão das reclamações trabalhistas, ainda que sucumbentes os trabalhadores, mas agraciados com a gratuidade da justiça.
A penúltima novidade foi a edição do CPC (LGL\2015\1656), de 2015, que derrogou quase que por completo as disposições da Lei 1.060, de 1950 (LGL\1950\1)3, de modo que várias das suas novas regulamentações passaram a ser aplicáveis, de forma subsidiária e supletiva, ao processo do trabalho4. Em termos concretos, até o dia anterior à vigência da reforma trabalhista, a assistência jurídica aos necessitados deveria ser prestada pelo sindicato da categoria, inclusive aos empregados que não eram sindicalizados, mas que contribuíam compulsoriamente para a manutenção da entidade, sem prejuízo da possibilidade da gratuidade da justiça, mesmo quando as partes litigassem por meio de advogado particular. Nesse caso, a justiça gratuita isentava-lhes das custas, honorários periciais e demais despesas processuais, bastando, para tanto, comprovar a condição de desemprego, o recebimento de até dois salários mínimos ou, ainda que percebessem acima desse patamar, declarassem que não tinham condições de litigar em juízo sem prejuízo do sustento próprio ou da sua família, o que poderia ser feito pelo advogado, com poderes específicos, em qualquer momento ou grau de jurisdição.
Isto é, antes da entrada em vigor da reforma trabalhista, nos limites do processo do trabalho, as regulamentações dos direitos constitucionais de acesso à justiça e da assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados, estavam nos artigos 789 e 790 da CLT (LGL\1943\5), na Lei 5.584/1970 (LGL\1970\8), bem como na aplicação subsidiária da Lei 1.060/1950 (LGL\1950\1), naquilo em que não derrogada pelo CPC (LGL\2015\1656), de 2015, e, finalmente, na aplicação subsidiária e supletiva deste último.
3.A justiça gratuita no processo do trabalho atual
Avancemos agora para descrever as alterações levadas a efeito na CLT (LGL\1943\5) pela reforma trabalhista (Lei 13.467, de 2017 (LGL\2017\5978)), para demonstrar como atualmente está o regramento da gratuidade da justiça, desde novembro de 2017, inclusive com as complementações do CPC (LGL\2015\1656), de 2015, naquilo em que for aplicável e compatível com o novo microssistema de direito processual trabalhista.
Para a redação do art. 790, § 3o, da CLT (LGL\1943\5), a situação de miserabilidade econômica será presumida àqueles que perceberem salário equivalente a até 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência7, alcançando a grande maioria dos litigantes nos processos trabalhistas, que, de resto, propõem a ação após o fim do vínculo contratual, já estando na condição de desempregados. Anote-se que a mudança do critério para a presunção de miserabilidade, dos antigos dois salários mínimos para 40% do limite máximo dos benefícios da Previdência, amplia o valor total, de forma a alcançar um contingente maior de jurisdicionados, a quem está o magistrado trabalhista, de qualquer instância, autorizado a conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da gratuidade.
Embora a nova dicção do art. 790, § 3o, da CLT (LGL\1943\5), sinalize no sentido de presumir economicamente débeis apenas aqueles que recebam até o equivalente acima apontado, o § 4o do mesmo dispositivo acrescenta que a gratuidade da justiça será concedida, também, ao litigante que comprovar insuficiência de recursos para a quitação dos custos do processo, acenando para a interpretação de que, mesmo os que recebem salário superior aos 40% do limite máximo dos benefícios da Previdência, desde que provem a insuficiência econômica – militando a presunção legal em seu favor (art. 99, §§ 2o e 3o, do CPC (LGL\2015\1656)), a partir da sua declaração –, também poderão dela desfrutar, inclusive alcançando agora as pessoas jurídicas.
Nos limites do processo do trabalho, inicialmente, foi divergente a tese da extensão da gratuidade da justiça para os empregadores, normalmente réus das ações; em um segundo momento, tanto a doutrina9, quanto a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho10, passaram a admitir a possibilidade de apenas os empregadores, pessoas naturais, usufruírem da justiça gratuita, mediante a objetiva comprovação da miserabilidade econômica; no terceiro e atual momento, já na vigência do CPC (LGL\2015\1656), de 2015, e sob influência da Súmula 481 do STJ11, também os empregadores, pessoas jurídicas (art. 98 do CPC (LGL\2015\1656)), e não somente as naturais, terão acesso ao benefício legal da gratuidade12, preenchidos os mesmos requisitos e garantindo-se-lhes, antes de qualquer decisão interlocutória de rejeição do pedido, a concessão de prazo para a juntada dos documentos para prova da sua condição de carência financeira efetiva (art. 99, § 2o, do CPC (LGL\2015\1656)).
Interpretamos a citada disposição do art. 99, § 2o, do CPC (LGL\2015\1656), primeiro como aplicável ao processo do trabalho, na vertente supletiva; segundo, como a garantia de ambas as partes, antes de terem os pedidos de gratuidade rejeitados pelo juiz, mediante impugnação da parte contrária ou porque o juiz entendeu não preenchidos todos os requisitos legais, que lhes seja assegurado prazo para trazer aos autos novas provas da situação de insuficiência econômica, na mesma linha do que defende José Cairo Jr: “(...) o pedido só pode ser indeferido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a sua concessão. Antes de indeferir, todavia, o juiz ou tribunal deve conferir à parte o direito de comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.”13
A rigor, a dispensa do pagamento das custas e despesas processuais para as pessoas jurídicas não é propriamente uma novidade no processo do trabalho, visto que à União, aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e às suas fundações e autarquias, já era garantida a prerrogativa da gratuidade, por força de previsão específica do Decreto-Lei 779, de 1969 (LGL\1969\24).
São beneficiários em potencial da gratuidade da justiça, no processo do trabalho atual, todas as pessoas naturais, jurídicas ou entes despersonalizados, empregados ou empregadores, ampliando-se a garantia constitucional do acesso à justiça. Mas a presunção legal de miserabilidade alcança aqueles que recebem até o limite de 40% do benefício máximo da Previdência, autorizando a concessão de ofício pelo juiz; já para aqueles que recebem acima desse limite, há necessidade de pedido expresso, conjugado com a declaração de insuficiência financeira deduzida pela pessoa natural, ocasião em que, mediante impugnação pela parte adversa, deverá o juiz conceder o direito de produção de provas da condição alegada, antes de decidir; já para as pessoas jurídicas não há presunção legal de miserabilidade14, nem a faculdade de firmar declaração, antes devendo comprovar objetivamente nos autos a situação excepcional de insuficiência de recursos (Súmula 463, II, do TST), por qualquer meio processual idôneo15, na medida em que a presunção, em relação às sociedades empresárias, é que são lucrativas (art. 2o da CLT (LGL\1943\5)). Por fim, em relação às associações civis sem fins lucrativos, às instituições beneficentes, às empresas em recuperação judicial, falência16 e em intervenção judicial, a prova da insuficiência econômica ficará facilitada, mas jamais será presumida.
A decisão que rejeitar o pedido de gratuidade terá, em regra, natureza jurídica de decisão interlocutória (art. 101 do CPC (LGL\2015\1656)), sendo, no processo do trabalho, atacável imediatamente por mandado de segurança ou, de forma diferida, pelo recurso ordinário da sentença de fundo. Quando do julgamento recursal, o relator, em sede de preliminar, avaliará o acerto da decisão anterior e poderá revê-la, mas, ainda que não o faça, entendemos que deva resguardar à parte o direito de prazo para providenciar o recolhimento das custas e do preparo, a autorizar que o Tribunal, então, avance no julgamento do mérito do seu recurso (art. 101, § 2o, do CPC (LGL\2015\1656)). Superado o debate a respeito da gratuidade, com a decisão final de seu indeferimento, a parte deverá efetuar também o recolhimento de todas as despesas anteriores (art. 102 do CPC (LGL\2015\1656)), sob pena de extinção do processo sem resolução de mérito, no caso do autor da ação, ou da rejeição da realização de qualquer ato ou diligência, tratando-se da defesa.
A CLT (LGL\1943\5) não avançou para especificar o objeto do benefício, mantendo-se a técnica redacional anterior de que a gratuidade alcança inclusive os traslados e os instrumentos, de modo que também é incidente a aplicação complementar do CPC (LGL\2015\1656). Este, em seu artigo 98, § 1o, traz um rol meramente exemplificativo, conforme também defende a doutrina especializada17, no qual se destacam as taxas ou custas judiciais, os honorários do intérprete, tradutor e contador, os emolumentos etc., mas que, em uma leitura afinada com os direitos fundamentais de ampliação do acesso à justiça e da assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados, sinaliza com precisão na direção de isentar toda e qualquer despesa processual ou extrajudicial, relacionada ao trâmite da ação, em sentido amplo18.
Considerando-se que na jurisprudência trabalhista a primeira posição era no sentido de que apenas os empregados, autores da ação, eram alcançados pelos benefícios da gratuidade, não havia espaço para a discussão quanto à dispensa do recolhimento do depósito recursal. Contudo, na segunda fase, em que se admitiu que também os empregadores pessoas naturais, excepcionalmente e mediante prova, pudessem ser alcançados, a interpretação do Tribunal Superior do Trabalho inclinou-se na linha de que o depósito recursal não tinha natureza jurídica de taxa judiciária, mas de pressuposto processual objetivo, sendo, por isso, exigível o seu recolhimento, mesmo aos empregadores beneficiários da gratuidade19.
A questão nova que se coloca é que o CPC de 2015, na omissão da CLT (LGL\1943\5) a respeito do tema, diz, em seu art. 98, § 1o, VIII, que a gratuidade compreende os depósitos previstos em lei para a interposição de recursos, inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório.
Fredie Didier Jr e Rafael Alexandria de Oliveira defendem que a isenção dos depósitos compreende todos aqueles inerentes ao pleno exercício do direito de acesso à jurisdição, na medida em que o objetivo do inciso é muito claro: “(...) a falta de recursos financeiros não pode representar óbice para o exercício do direito de ação, de recurso (que é corolário do primeiro) ou para o exercício da ampla defesa e do contraditório.”20 Contudo, advertem os mesmos autores, a disposição não pode ser invocada como se tivesse efeito liberatório geral, de todo e qualquer depósito ou caução, incidindo naqueles casos em que não atritar com o direito de ação, como nos casos de caução para cumprimento provisório (art. 520, IV, do CPC (LGL\2015\1656)), a caução para concessão de tutela de urgência (art. 300, § 1o), bem como na aplicação das multas de natureza processual (art. 98, § 4o, do CPC (LGL\2015\1656)), eis que, nos primeiros dois casos, a própria legislação já trouxe quais os requisitos para a dispensa do depósito ou caução, independentemente de a parte ser ou não beneficiária da gratuidade.
Reforça essa distinção doutrinária a previsão do art. 968, § 1o, do CPC (LGL\2015\1656), sem correspondência na legislação processual comum revogada, a qual dispensa o recolhimento do depósito prévio ao ajuizamento da ação rescisória, quando a parte for beneficiária da justiça gratuita, mesma interpretação, agora vinculante, do STF, em relação à inconstitucionalidade da exigência de depósito prévio como requisito de admissibilidade de ação judicial para discutir a exigibilidade de crédito tributário21.
Antes mesmo, o próprio Supremo havia pacificado que é inconstitucional a exigência de depósito prévio ou caução, como requisito para a admissibilidade dos recursos de natureza administrativa22. Se o texto da súmula vinculante efetivamente não alcança a hipótese do depósito recursal trabalhista, que possui natureza jurídica processual e não administrativa, o estudo aprofundado da ratio decidendi dos julgados que deram origem a ele, revela a interpretação no sentido mais ampliativo quanto ao mesmo raciocínio. Vejamos trecho importante de julgado do Plenário:
A exigência de depósito ou arrolamento prévio de bens e direitos como condição de admissibilidade de recurso administrativo constitui obstáculo sério (e intransponível, para consideráveis parcelas da população) ao exercício do direito de petição (CF (LGL\1988\3), art. 5o, XXXIV), além de caracterizar ofensa ao princípio do contraditório (CF (LGL\1988\3), art. 5o, LV). A exigência de depósito ou arrolamento prévio de bens e direitos pode converter-se, na prática, em determinadas situações, em supressão do direito de recorrer, constituindo-se, assim, em nítida violação ao princípio da proporcionalidade. (STF – Pleno – ADI 1976 – rel. Min. Joaquim Barbosa – DJ 18.05.2007).
Destarte, a nossa interpretação é a de que a gratuidade da justiça alcança os valores do depósito recursal, para todos os litigantes nos processos trabalhistas, trabalhadores23 ou empregadores, além de todas as outras modalidades de réus em ações de competência ampliada da Justiça do Trabalho, desde que atendam todos os requisitos para a concessão dos benefícios da justiça gratuita, exigindo-se, então, uma nova leitura pelo Tribunal Superior do Trabalho, em típica superação do antigo entendimento, em razão da novidade legislativa de 2015 (prospective overruling).
Uma última palavra precisa ser dita em relação ao objeto da gratuidade da justiça. Enxergamos que a aplicação supletiva do art. 98, § 4o, do CPC (LGL\2015\1656), que deixa assente que a sua concessão não isenta o beneficiário de pagar, ao final, as multas processuais que lhe sejam impostas, condensa uma jurisprudência do Supremo Tribunal Federal nesse sentido24, sendo, por isso, aplicável ao processo do trabalho, justamente porque as penas visam impedir a procrastinação processual e a utilização abusiva do direito de demandar e de se defender.
Nessa linha, andou bem o Tribunal Superior do Trabalho, ao decidir que o condicionamento da admissibilidade recursal ao prévio recolhimento da multa imposta pela litigância de má-fé é desnecessário, isentando a parte do depósito, ainda que não beneficiária da gratuidade, já que o pagamento não é pressuposto legal objetivo para interposição dos recursos de natureza jurídica trabalhista25, sendo a sua cobrança realizada ao final, após o trânsito em julgado.
Novidade trazida com o CPC (LGL\2015\1656) e que tem aplicação subsidiária no processo do trabalho, principalmente diante da recente admissão da gratuidade da justiça às pessoas naturais e jurídicas, empregadoras, é a possibilidade de o juiz autorizar o parcelamento das despesas, atenuar o seu valor global ou mesmo concedê-lo de forma proporcional, somente para alguns atos, conforme decida e fundamente, apontando que o litigante – ao se posicionar na região fronteiriça entre a insuficiência financeira e a pujança econômica – poderia custear, parcial ou parceladamente, as despesas do processo, tudo conforme art. 98, §§ 5o e 6o.
4.Efeitos da gratuidade para a parte sucumbente em honorários advocatícios e periciais
Já em relação ao custeio dos honorários dos peritos e dos advogados, aparentemente a nova redação da CLT (LGL\1943\5) diverge do CPC (LGL\2015\1656), impondo condição mais gravosa aos trabalhadores. Para o processo comum, a benesse proporcionada pela gratuidade da justiça alcança, também, “os honorários do advogado e do perito e a remuneração do intérprete ou do tradutor nomeado” (art. 98, § 1o, VI, do CPC (LGL\2015\1656)), já o novel art. 790-B, caput, in fine, da CLT (LGL\1943\5) ressalva que os honorários periciais serão suportados pelo sucumbente em seu objeto, ainda que beneficiário da gratuidade, bem como o art. 791-A, § 4o, ressalva que os honorários do advogado serão devidos pelo sucumbente, ainda que beneficiário da justiça gratuita, desde que tenha obtido judicialmente, mesmo em outra ação, créditos capazes de suportar a despesa.
Dissemos que, aparentemente, divergem as redações do CPC (LGL\2015\1656) e da nova CLT (LGL\1943\5) na medida em que parece dispensar o pagamento dos honorários, periciais e dos advogados, no processo civil, mas determinar o desconto dos trabalhadores, a partir dos seus créditos obtidos, no processo do trabalho, gerando situação gravosa e diferenciada aos litigantes da justiça especializada. Entretanto, ao aprofundar a análise das disposições, com a inversão e o realinhamento dos modais deônticos das normas que a partir delas são construídas pelo jurista, chegaremos à conclusão de que as soluções são, praticamente, idênticas em ambos os sistemas processuais.
Isso porque, no paradigma do processo civil, a regra é a do adiantamento das custas e despesas processuais, antes da realização dos respectivos atos (art. 82 do CPC (LGL\2015\1656)), salvo quando concedida a gratuidade da justiça, ocasião em que o seu beneficiário fica dispensado da realização do adiantamento, mas, ao final e em caso de sucumbência, será condenado sempre a fazê-lo, independentemente da gratuidade já concedida, quando os valores devidos serão por ele suportados, se adquirir condições financeiras para tanto, durante o curso do próprio processo ou nos próximos 5 (cinco) anos, conforme se extrai claramente do art. 98, §§ 2o e 3o, do CPC (LGL\2015\1656) (condição suspensiva de exigibilidade).
Fredie Didier Jr. e Rafael Alexandria de Oliveira bem observaram que os beneficiários da gratuidade da justiça estão apenas dispensados do adiantamento das despesas processuais, atuando no âmbito da responsabilidade provisória pelo custeio do processo, mas não, contudo, do pagamento dessas mesmas despesas ao final do processo, se restarem sucumbentes, após o trânsito em julgado. Quer dizer, “(...) ainda que seja beneficiário da gratuidade da justiça, o vencido tem o dever de, observado o disposto no § 3o do art. 98 do CPC (LGL\2015\1656), arcar com o pagamento do que lhe foi dispensado e ainda ressarcir a parte adversária, vencedora, quanto ao que ela adiantou ao longo do processo”.26
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal também se pacificou no sentido de que não há nenhuma inconstitucionalidade, ou mesmo incompatibilidade ontológica entre a condenação nas custas e despesas processuais e a concomitante concessão da gratuidade, na medida em que esta é condição suspensiva, enquanto perdurar a situação fática de miserabilidade, não inviabilizando a sua condenação e a futura execução, caso a parte adquira condições de fazê-lo27. Em palavras outras, deve-se distinguir imunidade de suspensão temporária da exigibilidade, na linha que atualmente foi acolhida textualmente pelo processo civil: “A concessão da gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência”. (art. 98, § 2o, do CPC (LGL\2015\1656)).
Em decisão mais recente, a Corte Suprema reafirmou a distinção entre isenção e suspensão da exigibilidade das despesas processuais, de forma precisa:
(...) o beneficiário da justiça gratuita, quando vencido, deve ser condenado a ressarcir as custas antecipadas e os honorários do patrono vencedor. Entretanto, não está obrigado a fazê-lo com sacrifício do sustento próprio ou da família. Decorridos cinco anos sem melhora da sua situação econômica, opera-se a prescrição da dívida. Por um lado, não se trata de menosprezar o princípio da sucumbência, mas apenas de suspender a exigência da condenação do vencido enquanto sua situação econômica permanecer precária, pois a imposição do cumprimento da obrigação importaria dano para sua sobrevivência ou de sua família. Portanto, o benefício da justiça gratuita não se constitui na isenção absoluta das custas e dos honorários advocatícios, mas, sim, na desobrigação de pagá-los enquanto perdurar o estado de carência econômica do necessitado, propiciador da concessão deste privilégio. Em resumo, trata-se de um benefício condicionado que visa garantir o acesso à justiça, e não a gratuidade em si. (STF – Plenário – RE 249.003-AgRg – rel. Min. Edson Fachin – DJE 10.05.2016).
As novas redações dos artigos 790-B, § 4o, e 791-A, § 4o, ambos da CLT (LGL\1943\5), caminham no mesmo sentido do processo civil, eis que a concessão dos benefícios da justiça gratuita – vistos os requisitos no momento do ajuizamento e apreciação pelo magistrado trabalhista – não impede a condenação nas custas e despesas processuais, como os honorários advocatícios e periciais, quando do julgamento de fundo, sendo que, em relação aos honorários advocatícios, mantém-se suspensa a exigibilidade, até que o sucumbente adquira condições de suportá-los, a partir do recebimento de créditos, nos próprios autos ou em outros, retirando-o da condição de miserabilidade jurídico-econômica, a autorizar, inclusive, a revogação posterior do benefício da gratuidade. A cobrança, assim, ocorrerá nos próprios autos, no prazo de até 2 (dois) anos depois do trânsito em julgado, cujo decurso sem que a parte adquira condições financeiras de suportar o encargo, importará na extinção da obrigação (prescrição da pretensão executiva).
Uma leitura apressada do art. 791-A, § 4o, da CLT (LGL\1943\5), pode sugerir que os beneficiários da gratuidade, tendo recebido qualquer valor no processo, de qualquer natureza jurídica, poderiam ver o montante penhorado para quitação dos honorários do advogado adversário28. Porém, essa leitura seria inconstitucional29 e ilegal, na medida em que o art. 5o, inciso LXXIV, da Constituição, garante a justiça gratuita e integral aos necessitados, daí não se admitir que alguém alcançado pelo direito em evidência seja, ao mesmo tempo, constrangido a pagar as despesas do processo, enquanto se mantiver juridicamente pobre; é ilegal ainda, por violação do art. 98, § 1o, VI, do CPC (LGL\2015\1656), de aplicação supletiva ao processo do trabalho, impondo, então, ao jurista, que busque uma nova interpretação compatível com a Carta Maior.
Chegamos ao ponto de fixar a segunda premissa, qual seja: a regra quanto aos benefícios da justiça gratuita e quanto às despesas com honorários é a mesma no processo civil e do trabalho, de que os beneficiários da gratuidade, muito embora devam ser condenados, não devem pagar referidas despesas do processo, salvo se, ao longo dele ou no prazo de suspensão da exigibilidade, posterior ao trânsito em julgado, adquirirem condições financeiras que os retirem da posição de agraciados pela gratuidade, quando o juiz deverá, então, revogá-la, colocando o seu crédito à disposição para penhora pelo advogado da parte adversa, na cobrança dos seus honorários30.
Então, não é qualquer valor recebido na ação que irá autorizar a penhora automática para quitação dos honorários, mas aquele montante que seja capaz de retirar a parte da condição de miserabilidade jurídica. Nas palavras do novel art. 791-A, § 4o, da CLT (LGL\1943\5), “créditos capazes de suportar a despesa”.
A questão, então, passa a se definir o parâmetro financeiro que será capaz de retirar o sucumbente da situação de miserabilidade, colocando-o em condições de suportar a despesa, com a revogação da gratuidade da justiça.
Uma primeira tendência é buscar, na própria CLT (LGL\1943\5), os critérios para a concessão da gratuidade. Assim, quando os mesmos parâmetros desaparecerem, significa que estaria, também, autorizada a sua revogação.
O art. 790, § 3o, da CLT (LGL\1943\5), com a redação atribuída pela reforma trabalhista, diz que são beneficiários os desempregados e também aqueles que recebam salário de até 40% do limite máximo dos benefícios do RGPS. Logo, todos os créditos obtidos na ação que sobejarem o referido parâmetro financeiro poderiam ser penhorados. Porém, essa leitura não nos parece a melhor, na medida em que o critério salarial é mensal e os valores recebidos na ação, em regra, são o resultado de violações contratuais ocorridas ao longo dos anos, de sorte que o trabalhador não poderá ser prejudicado pelo pagamento tardio, em juízo e acumulado, das verbas a que teria direito, mês a mês, durante o contrato, ocasião em que permaneceria sob a proteção da presunção legal de miserabilidade, se o seu salário não avançasse além do valor mensal de R$ 2.258,32, para o ano de 2018.31
O caminho, então, é buscar outros parâmetros no ordenamento jurídico.
Antonio Umberto, Fabiano Coelho, Ney Maranhão e Platon Neto são da posição de que essa análise deve ser feita caso a caso, sem um parâmetro universal e financeiro objetivo, autorizando a penhora dos créditos obtidos na ação para pagar os honorários apenas quando o montante recebido seja de tal vulto capaz de alterar a condição econômica do agraciado. Em palavras suas, “(...) o beneficiário da justiça gratuita só suportará tais despesas caso aufira créditos cujo montante promova contundente e indiscutível alteração de sua própria condição socioeconômica”.3233
Concordamos com a essência da afirmação dos autores, que é no mesmo sentido do que defendemos linhas citadas, de que não é o recebimento de qualquer montante que irá autorizar a imediata penhora para pagamento dos honorários, mas somente de valor que retirar o sucumbente da condição de miserabilidade.
Entretanto, acreditamos que há espaço para avançar, na busca de critério mais objetivável, inclusive para evitar que situações iguais sejam tratadas de modo diferenciado pelo Judiciário, violando a isonomia. Para tanto, basta imaginar que um magistrado entenda que o recebimento de R$ 15.000,00 seja suficiente para alterar a condição financeira do trabalhador, porém outro magistrado – que está a julgar a mesma situação de colegas de trabalho, com os mesmos pedidos, em ações que tramitam simultaneamente –, que tenha um senso protetivo mais aguçado, venha a considerar que o recebimento de R$ 80.000,00 não seja suficiente para retirar o autor dessa segunda ação da condição de miserabilidade, contradição que, fatalmente, exigirá das instâncias superiores a pacificação da controvérsia e a busca de critérios mais objetiváveis.
É nesse contexto que entendemos que seja um critério operacional inicial o quanto previsto no art. 833, X, do CPC (LGL\2015\1656), que trata da impenhorabilidade, dizendo que os valores depositados em caderneta de poupança até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos são insuscetíveis de penhora, justamente porque tal limite revela que tais valores, se retirados, podem prejudicar o sustento próprio e da família do devedor, exatamente o critério principal para o reconhecimento da condição de miserável jurídico, requisito para a concessão – e agora, revogação – dos benefícios da justiça gratuita. Logo, em nosso sentir, um critério a priori seria o montante de 40 (quarenta) salários mínimos recebidos na ação trabalhista, cujo valor é o teto para considerar que o trabalhador ainda é juridicamente pobre, não autorizando, até este limite, a revogação da gratuidade e, com isso, a penhora dos valores para pagamento dos honorários do advogado. Apenas os créditos que sobejarem tal montante é que serão suscetíveis de penhora para pagamento do profissional da advocacia, na medida em que esse excedente é considerado pelo próprio ordenamento penhorável, isto é, dispensável para resguardar ao seu titular e sua família a manutenção do seu sustento básico.
Contudo, poderão ocorrer casos excepcionais, cujo ônus argumentativo e probatório recairá sobre o trabalhador sucumbente, que deve demonstrar que o recebimento de créditos superiores ao parâmetro de 40 (quarenta) salários mínimos ainda é, na sua situação pessoal específica, insuficiente para manutenção básica sua e da família, como nos casos de dependente com doença grave, que necessita realizar uma cirurgia de alto custo ou tratamento etc., situações excepcionais que, como dito, não invalidam o critério objetivo a priori, mas que apenas o reafirmam, para todas as situações normais ou ordinárias.
Avançamos, então, para reconhecer que o recebimento na reclamação de valores além do teto de 40 (quarenta) salários mínimos retira, em regra, o litigante beneficiário da gratuidade da condição de miserabilidade jurídica, abrindo as portas para a revogação da graciosidade e autorizando a penhora do valor excedente.
Entretanto, a questão ainda não está resolvida, eis que remanescerá o argumento de que as verbas recebidas em uma ação trabalhista, ainda que sejam suficientes para revogação da gratuidade, são de natureza jurídica salarial/alimentar, superprivilegiada (art. 84 da Lei 11.101/2005 (LGL\2005\2646)), insuscetível, por isso, de penhora, independentemente do seu valor global, na forma do art. 833, IV, do CPC (LGL\2015\1656).
A impenhorabilidade é decorrente do princípio da intangibilidade salarial, com residência no art. 8o, 1, da Convenção 95 da OIT, no art. 7o, X, da CF/88 (LGL\1988\3) e no art. 462 da CLT (LGL\1943\5), que poderiam ser invocados para bloquear a tentativa legislativa da reforma trabalhista de descontar dos créditos dos trabalhadores (de natureza jurídica salarial) as despesas do processo, a indicar, em uma primeira leitura, uma negativa aos testes de convencionalidade e constitucionalidade do art. 791-A, § 4o, da CLT (LGL\1943\5).
Mas o certo é que, tanto a Convenção 95 da OIT, quanto o art. 7o, X, da Constituição de 1988, com a regulamentação do art. 462 da CLT (LGL\1943\5), excepcionam do princípio da intangibilidade os descontos autorizados formalmente por lei, inclusive a pacífica jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho deu amplitude à exceção, ao admitir como legítimos os descontos previstos em normas coletivas34, de modo que o argumento principiológico da intangibilidade não seria suficiente para paralisar a eficácia das novas disposições da CLT (LGL\1943\5), que admitem o desconto das despesas dos processos dos créditos recebidos pelo autor da ação.
Já em relação ao argumento da impenhorabilidade do salário, primeiro é preciso deixar claro que nem todos os valores recebidos pelo trabalhador por meio de uma ação trabalhista têm natureza jurídica de salário em sentido estrito. Mas, mesmo na maioria dos casos, em que as verbas pleiteadas têm natureza jurídica salarial, portanto alimentar, a disposição do art. 833, IV, in fine, do CPC (LGL\2015\1656), equipara os honorários dos profissionais liberais à mesma equivalência jurídica de salário em sentido lato, remetendo ao § 2o a autorização de penhora excepcional dos salários, para a quitação de prestação alimentícia, “independentemente de sua origem”35, a legitimar a apreensão dos créditos dos trabalhadores, mesmo os de natureza salarial em sentido estrito. Trata-se de uma opção político-legislativa, que, se não é a melhor, na visão de alguns autores, ainda assim encontra-se dentro da margem de conformação atribuída pela Constituição e pelos específicos tratados internacionais, ao legislador ordinário nacional, posição esta perfilhada pela atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça36, que tem a incumbência constitucional de pacificar a interpretação das disposições do CPC (LGL\2015\1656).
A conclusão alhures também terá incidência nos casos em que o autor da ação foi vencedor, restando o réu-empregador sucumbente nos honorários devidos ao advogado do trabalhador, caso em que, tratando-se de executado pessoa física, que vive apenas do seu salário e não tenha bens suscetíveis de penhora, também haverá possibilidade de bloqueio de parte do seu salário para pagamento da verba ao exequente e ao seu advogado, tudo na forma do art. 833, IV e § 2o, do CPC (LGL\2015\1656), já referidos, posição que ganha corpo no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho37 e já é pacífica também no Superior Tribunal de Justiça, inclusive, a Corte Especial deste, recentemente, avançou mais ainda ao admitir que mesmo nas execuções de obrigações que não tenham natureza jurídica alimentar, privilegiada, seria possível penhorar a cota de 30% do salário para satisfação da execução38.
Por tudo quanto demonstrado, entendemos que Jorge Alberto Araújo faz confusão quando defende que os créditos obtidos pelo trabalhador na reclamação trabalhista não podem ser penhorados, independentemente do valor, se forem de natureza jurídica salarial, desconsiderando a cláusula de exceção do citado art. 833, § 2o, do CPC (LGL\2015\1656), porém, para o mesmo autor, se o total ou parte do crédito for de outra natureza, poderia ocorrer a penhora, admitindo que, se o postulante obtiver apenas créditos de natureza diversa da alimentar, todo esse valor poderia ser utilizado para quitação dos honorários advocatícios sucumbenciais, mesmo que beneficiário da justiça gratuita, ficando o trabalhador sem proveito algum do processo39, desta feita a desconsiderar os efeitos da gratuidade, incidindo em inconstitucionalidade.
Por fim, já no caso específico dos honorários periciais, a lógica inicial é a mesma, qual seja, se o sucumbente obtiver créditos que o retire da condição de miserabilidade, o juiz revogará os benefícios concedidos e autorizará que o valor recebido seja penhorado para pagar os honorários do expert. A única diferença em relação aos honorários do advogado é a de que se o autor não tiver obtido em juízo crédito algum, naquele processo ou em outro, o perito não ficará aguardando por dois anos o incremento de patrimônio do sucumbente, com exigibilidade suspensa, mas haverá quitação imediata pela própria União, por meio de fundo destinado ao custeio desta modalidade de despesa processual (art. 790-B, § 4o, da CLT (LGL\1943\5)).
5.Recolhimento prévio das custas para a repropositura da ação anteriormente arquivada
O último ponto que merece reflexão aprofundada é em relação à redação atribuída ao art. 844, §§ 2o e 3o, da CLT (LGL\1943\5), que admite a condenação do autor da ação que ausentar-se injustificadamente da audiência inicial, ensejando o arquivamento da reclamação (rectius: extinção do processo sem resolução do mérito), nas custas do processo, ainda que beneficiário da justiça gratuita, condicionando a sua quitação ao ajuizamento de uma nova ação judicial.
Primeiro, há uma antinomia aparente entre os textos vigentes da CLT (LGL\1943\5), pois o art. 790-A, caput, diz que são isentos das custas os beneficiários da justiça gratuita, ao passo que no art. 844, § 2o, diz que esses mesmos beneficiários devem pagar custas, no caso de arquivamento injustificado. A antinomia pode ser resolvida pelos critérios de temporalidade e especialidade, conforme determina o art. 2o, §§ 1o e 2o, do Decreto-Lei 4.657/1942 (LGL\1942\3) (LINDB), de sorte que os beneficiários da gratuidade continuam, em regra, sendo isentos das custas, ressalvada a nova situação trazida pela lei da reforma trabalhista, que cuida da hipótese especial de extinção pela ausência do reclamante na primeira audiência, quando as custas, então, deverão ser fixadas e atribuídas aos trabalhadores – não mais isentos –, porém ficarão com a exigibilidade suspensa, enquanto mantiverem a condição de miserabilidade jurídica.
O problema parece-nos estar, contudo, no novel § 3o, do art. 844, da CLT (LGL\1943\5), ao condicionar o ajuizamento de nova ação ao pagamento das custas, inclusive para o beneficiário da justiça gratuita, caso em que entendemos que o legislador avançou em terreno interditado pelo constituinte, ao ofender o núcleo essencial dos direitos fundamentais de amplo acesso à justiça e, principalmente, à assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados, autorizando que os juízes exerçam a jurisdição constitucional, com o controle difuso de constitucionalidade.
Nesse mesmo sentido foi a percepção do Procurador-Geral da República, que propôs perante o Supremo Tribunal Federal ação direta de inconstitucionalidade (ADI 5766 – rel. Min. Roberto Barroso), inquinando de inconstitucional a tentativa de vedação de acesso ao Poder Judiciário para os comprovadamente necessitados, cujo julgamento ainda não foi concluído40.
A interpretação possível e afinada com as garantias da Constituição é a de que o autor da ação, beneficiário da justiça gratuita, poderá ser condenado nas custas em caso de
arquivamento injustificado, mas o seu pagamento deverá se dar mediante a técnica dos artigos 790-B, § 4o, 791-A, § 4o, da CLT (LGL\1943\5), combinados com o art. 98, §§ 2o e 3o, do CPC (LGL\2015\1656), aguardando-se o prazo de até dois anos o autor auferir resultados financeiros em outras ações – inclusive naquela que pretenda repropor – para que as despesas sejam satisfeitas, mas jamais interditar o acesso ao Judiciário, ainda mais grave para os comprovadamente necessitados41 e, por isso, beneficiários da gratuidade, conforme a ratio decidendi dos precedentes do Supremo Tribunal que deram origem às Súmulas Vinculantes de números 21 e 28.
Na perspectiva processual, significa dizer que o magistrado condutor da ação originária, na ausência do autor à audiência inicial, extinguirá o processo sem resolução do mérito, concederá os benefícios da justiça gratuita – se presentes os seus requisitos – e concederá o prazo de 15 (quinze) dias para o autor justificar o motivo da sua ausência (art. 844, § 2o, da CLT (LGL\1943\5)). Se o fizer, obterá a isenção das custas (art. 790-A, caput, da CLT (LGL\1943\5)); se não o fizer, ou a justificativa não for acolhida, o juiz, então, condenará nas custas processuais, cuja exigibilidade ficará suspensa, caso em que, obtendo condições de fazê-lo, dentro do prazo prescricional, terá início a execução, nos próprios autos, para quitação da obrigação tributária42, inclusive podendo o crédito obtido na ação reproposta ser penhorado para a satisfação da obrigação, se não mais estiver o trabalhador acobertado pela gratuidade da justiça.
Independentemente dos procedimentos especificados em relação à ação originária, caso o reclamante pretenda repropor a ação trabalhista, poderá fazê-lo – inclusive antes do prazo de 15 (quinze) dias para justificativa na ação arquivada – e pedirá que o juiz da segunda ação, exercendo a jurisdição constitucional, realize o controle difuso de constitucionalidade, com a consequente declaração incidental de inconstitucionalidade do art. 844, § 3o, da CLT (LGL\1943\5), destrancando o acesso à jurisdição especializada, independentemente do pagamento prévio das custas.
Essa também é a compreensão de Raphael Miziara, para quem a novel permissão de condenação do beneficiário da gratuidade em custas, nos casos de ausência à audiência inaugural, ao contrário da anterior isenção, é constitucional, resguardando-se a suspensão da exigibilidade do tributo, enquanto durar a situação pessoal de miserabilidade, porém a exigência posterior, prevista no art. 844, § 3o, da CLT (LGL\1943\5), enquanto condicionante para a repropositura da ação extinta sem resolução do mérito, é descabida e inconstitucional, por afrontar o direito de acesso à jurisdição.43
Importante diferenciar a hipótese do novo art. 844, § 3o, da CLT (LGL\1943\5), da do art. 486, § 2o, do CPC (LGL\2015\1656), visto que este exige que, nas ações repropostas, a petição inicial já deverá trazer o comprovante de pagamento das custas e das despesas da ação anterior, então arquivada, mas cuja exigência não constrange os beneficiários da gratuidade, justamente porque a exigência, na prática, inviabiliza o acesso à justiça dos comprovadamente carentes de recursos, quando a diretriz constitucional é a de que a assistência jurídica será integral e gratuita aos necessitados. Para os que não são beneficiários da gratuidade, tanto para o processo civil quanto agora para o do trabalho, a exigência antecipada das custas e despesas, relacionadas à ação anterior já extinta, não viola o núcleo essencial do direito, pois a parte já exerceu o seu direito amplo de acesso à jurisdição e tem condições de pagar as despesas, no momento em que pretender acessar à jurisdição novamente.
6.Conclusões
Na vigência da legislação atual, o direito fundamental de assistência jurídica integral e gratuita, prevista no art. 5o, LXXIV, da Constituição, está regulamentado no processo do trabalho pela Lei 5.584, de 1970 (LGL\1970\8), e pela CLT (LGL\1943\5), com as alterações trazidas pela Lei 13.467, de 2017 (LGL\2017\5978), e também pelo CPC (LGL\2015\1656), de 2015 e pela Lei 1.060, de 1950 (LGL\1950\1), aplicando-se as últimas de forma subsidiária ou supletiva.
Os sujeitos do benefício da gratuidade, desde que atendam aos requisitos legais, com presunção ou não da condição de miserabilidade, conforme o caso, são todas as pessoas, naturais ou jurídicas, empregados ou empregadores, bem como os entes despersonalizados.
O objeto da justiça gratuita são todas as despesas processuais em sentido lato, inclusive aquelas extraprocessuais relacionadas ao trâmite da ação, de modo a que o acesso à justiça seja o mais eficiente e integral possível, aplicando-se, de forma supletiva, o art. 98, § 1o, do CPC (LGL\2015\1656), ao processo do trabalho.
Incidem no processo do trabalho as modalidades de parcelamento, isenção parcial ou abatimento do valor total das despesas, previstos no art. 98, §§ 5o e 6o, do CPC (LGL\2015\1656), inclusive também em relação aos empregadores.
A concessão do benefício da justiça gratuita atua na modalidade dos custos provisórios do processo, isentando o sujeito da antecipação das despesas, mas não o imuniza da condenação ao final, após o trânsito em julgado, quando sucumbente, inclusive sob o novo procedimento de cobrança, mediante o desconto do seu crédito obtido, na mesma ação ou em outras.
O critério objetivo a priori para considerar que o autor da ação, sucumbente no objeto da perícia e nos honorários advocatícios, deva ter os respectivos valores descontados ( rectius: penhorados) do crédito por ele obtido na ação, ou em outra, é o de 40 (quarenta) salários mínimos, por aplicação analógica do art. 833, X, do CPC (LGL\2015\1656).
É inconstitucional a disposição do art. 844, § 3o, da CLT (LGL\1943\5), se interpretada como exigência de pagamento prévio das custas nos casos de arquivamento das ações dos beneficiários da justiça gratuita, o que não impede uma interpretação alternativa de que tais valores tributários possam ser objeto de retenção posterior, se o trabalhador obtiver, ao final da ação reproposta, créditos suficientes.
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1 Gustavo Filipe Barbosa Garcia contribui com a distinção terminológica dos institutos da assistência jurídica integral e da gratuidade da justiça, especificamente no processo do trabalho, dizendo que: “Na realidade, a concessão da assistência judiciária abrange a justiça gratuita. Vale dizer, o trabalhador que goza da assistência judiciária (prestada pelo sindicato da categoria profissional) também usufrui dos benefícios da justiça gratuita, de modo que está isento do pagamento das custas e demais despesas processuais. No entanto, pode perfeitamente ocorrer a hipótese em que o trabalhador não usufrua da assistência judiciária prestada pelo sindicato da categoria profissional, mas goze, apenas, da justiça gratuita, por preencher os requisitos do § 3o do art. 790 da CLT (...). A justiça gratuita, portanto, deve ser concedida pelo juiz, se presentes os requisitos legais, mesmo que o trabalhador tenha advogado constituído nos autos.” (GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de Direito Processual do Trabalho, 2013. p. 265-266.
2 OJ 304 (recentemente cancelada) e OJ 331, ambas da SBDI-1 do TST.
3 CPC, art. 1072. Revogam-se: (...) III – os arts. 2o, 3o, 4o, 6o, 7o, 11, 12 e 17 da Lei no 1.060, de 5 de fevereiro de 1950;
4 Já tivemos ocasião de aprofundar e definir os critérios científicos para aplicação, subsidiária e supletiva, do direito processual comum ao processo do trabalho: MOLINA, André Araújo. O novo CPC e o processo do trabalho: pós-modernidade, antinomias, lacunas e o novo microssistema processual trabalhista individual. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, Brasília, v. 81, n. 3, p. 19-36, jul.-set. 2015.
5 Súmula 463 do TST. Assistência judiciária gratuita. Comprovação. I – A partir de 26.06.2017, para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, basta a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado, desde que munido de procuração com poderes específicos para esse fim (art. 105 do CPC de 2015); II – No caso de pessoa jurídica, não basta a mera declaração: é necessária a demonstração cabal de impossibilidade de a parte arcar com as despesas do processo. ( DEJT 12, 13 e 14.07.2017).
6 Nesse sentido a OJ 269 da SBDI-1 do TST.
7 Neste ano de 2018, o equivalente dos 40% resulta no valor salarial máximo de até R$ 2.258,32 (dois mil, duzentos e cinquenta e oito reais e trinta e dois centavos).
8 Antes da incorporação legislativa pelo CPC de 2015, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já havia se firmado nesse sentido, com a edição da Súmula 481 (DJE 01.08.2012).
9 Por todos, Mauro Schiavi defendia que “(...) se o empregador demonstrar que está em ruína financeira, o benefício da Justiça Gratuita deverá ser-lhe deferido.” (SCHIAVI, Mauro. Manual de Direito Processual do Trabalho, 2011. p. 327).
10 Neste sentido, também, a Resolução 66/2010 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, art. 2o, § 1o.
11 “Faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais”. (DJE 01.08.2012).
12 Após a vigência do CPC de 2015, o Tribunal Superior do Trabalho ajustou a sua jurisprudência para admitir, expressamente, a concessão dos benefícios da justiça gratuita às pessoas jurídicas, desde que comprovem insuficiência de recursos (Súmula 463 do TST).
13 CAIRO JÚNIOR, José. Curso de Direito Processual do Trabalho. 2016. p. 287.
14 Neste sentido decisão do Supremo Tribunal Federal: “Ao contrário do que ocorre relativamente às pessoas naturais, não basta a pessoa jurídica asseverar a insuficiência de recursos, devendo comprovar, isto sim, o fato de se encontrar em situação inviabilizadora da assunção dos ônus decorrentes do ingresso em juízo” (STF – Rcl 1.905 ED-AgR – rel. Min. Marco Aurélio – DJ 20.09.2002).
15 “A demonstração do estado de miserabilidade pode resultar de quaisquer outros meios probatórios idôneos”. (STF – 1a T. – HC 72.328 – rel. Min. Celso de Mello – DJE 11.12.2009).
16 Súmula 86 do TST.
17 Nesse sentido defendem DIDIER JR., Fredie; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Benefício da justiça gratuita, 2016. p. 27.
18 A lição de Augusto Tavares Marcacini é também a de que “(...) não é necessária para que se considere isento do pagamento de determinada verba, a previsão expressa em lei ordinária, pois o princípio constitucional do art. 5o, inciso LXXIV, no sentido em que o constituinte empregou, é bastante para isentar de todas as verbas”. (MARCACINI, Augusto Tavares. Assistência jurídica, assistência judiciária e justiça gratuita. 2001. p. 36).
19 Por todos: “Agravo de instrumento. Recurso de revista. Deserção. Justiça gratuita. Empregadora. Depósito recursal. Considerando que o benefício da justiça gratuita, nos termos do artigo 3o da Lei n. 1.060/50, limita-se às despesas processuais, não alcançando o depósito recursal correspondente à garantia do juízo, cuja finalidade é assegurar a exequibilidade da sentença, quando a empregadora reclamada não prepara seu recurso de revista com o depósito recursal disso resulta deserção e, forçosamente, o seu trancamento. Agravo de instrumento improvido”. (TST – 1a T. – AIRR 159000-79.2009.5.01.0030 – rel. Des. Conv. José Maria Quadros de Alencar – DEJT 10.10.2014).
20 Ibidem, p. 41.
21 Súmula Vinculante 28: É inconstitucional a exigência de depósito prévio como requisito de admissibilidade de ação judicial na qual se pretenda discutir a exigibilidade de crédito tributário. (DJE 17.02.2010).
22 Súmula Vinculante 21: É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo. (DJE 10.11.2009).
23 Nos casos em que os trabalhadores ocuparem, episodicamente, o polo passivo das ações, inclusive em sede de eventual reconvenção e restarem condenados, podendo acessar o duplo grau de jurisdição, independentemente de recolhimento das custas e do depósito recursal, quando beneficiários da justiça gratuita. Ressalve-se que havia posição majoritária anterior, inclusive no TST, defendendo que os § § 4a e 5a, do art. 899, da CLT, indicavam a interpretação pela dispensa do depósito recursal quando o réu fosse o trabalhador, indicando que o depósito recursal fosse feito na conta deste. Contudo, com as alterações levadas a efeito pela reforma trabalhista, Lei 13.467 de 2017, o citado § 4o foi alterado, suprimindo-se a necessidade de o depósito recursal se dar na conta do trabalhador, bem como o § 5o foi revogado.
24 “A multa a que se refere o art. 18 do CPC – também incidente sobre o beneficiário da gratuidade – possui inquestionável função inibitória, eis que visa a impedir a procrastinação processual e a obstar o exercício abusivo do direito de recorrer” (STF – 2a T. – AI 342.393 AgR-ED – rel. Min. Celso de Mello – DJE 23.04.2010).
25 OJ 409 da SBDI-1 do TST.
26 Ibidem, p. 22.
27 “Custas: condenação do beneficiário da justiça gratuita. O beneficiário da justiça gratuita que sucumbe é condenado ao pagamento das custas, que, entretanto, só lhe serão exigidas se, até cinco anos contados da decisão final, puder satisfazê-las sem prejuízo do sustento próprio ou da família: incidência do art. 12 da Lei 1.060/1950, que não é incompatível com o art. 5o, LXXIV, da Constituição.” (STF – 1a T. – RE 184.841 – rel. Min. Sepúlveda Pertence – DJ 08.09.1995).
28 Esta é a posição defendida por SILVA, Homero Batista Mateus da. Comentários à reforma trabalhista, 2017, p. 98-99, SCHIAVI, Mauro, A reforma trabalhista e o processo do trabalho. 2017. p. 84, SALES, Fernando Augusto de Vita Borges. Honorários advocatícios e justiça gratuita no processo do trabalho, p. 138 e GOES, Alfredo. A responsabilidade processual do beneficiário da justiça gratuita. 2018. p. 315-316.
29 Neste mesmo sentido, SOUZA JÚNIOR, Antonio Umberto et al. Reforma Trabalhista. 2018. p. 460-461, NASSAR, Rosita de Nazaré Sidrim. Honorários de sucumbência ao beneficiário da justiça gratuita. 2018. p. 780, TEIXEIRA FILHO, Manoel Antônio. O processo do trabalho e a reforma trabalhista. p. 163 e MIZIARA, Raphael. Novidades em torno do benefício da justiça gratuita. p. 99-100. O último autor referido defende a inconstitucionalidade tout court da disposição, não avançando para buscar uma interpretação conforme à Constituição, do novel art. 791-A, § 4o, da CLT. Para ele, concedidos os benefícios da gratuidade, os valores recebidos são insuscetíveis de penhora, devendo a exigibilidade permanecer suspensa, até o prazo de 2 anos.
30 Na perspectiva processual, é indispensável deixar sublinhada a nossa conclusão de que, por se revelarem crédito autônomo do advogado e que não há mais execução de ofício no processo do trabalho, em regra, na forma do novo art. 878 da CLT, os honorários advocatícios não podem ser objeto de determinação de retenção por ordem judicial, do crédito do autor da ação, como muitos julgados começaram a fazê-lo. Deverá, sim, o seu titular, após o trânsito em julgado, peticionar nos próprios autos, para iniciar e impulsionar a execução, demonstrando que o crédito recebido está acima do limite que garante a gratuidade da justiça, bem como indicando valores e bens, provenientes de outras origens, para apreensão e satisfação da obrigação.
31 Vitor Salino de Moura Eça defende uma posição bastante peculiar, tendo como parâmetro o valor mensal de 40% do teto de benefícios do RGPS, porém não em se considerando os valores obtidos no processo – estes sempre insuscetíveis de penhora, em razão da gratuidade judiciária concedida –, mas quando o sucumbente se recolocar no mercado de trabalho, passando a receber salário acima do parâmetro legislativo, ocasião em que, aí sim, para o autor, “talvez tenha mesmo de suportar os ônus sucumbenciais”. (EÇA, Vitor Salino de Moura. Despesas processuais trabalhistas após a reforma. 2018. p. 90).
32 SOUZA JÚNIOR, Antonio Umberto de; COELHO, Fabiano; MARANHÃO, Ney; NETO, Platon. Reforma trabalhista. 2018. p. 461.
33 No mesmo sentido, e com apoio na lição dos primeiros, é a interpretação de FILETI, Narbal Antônio de Mendonça. Comentários ao art. 791-A da CLT. 2018. p. 382.
34 Súmula 342, OJ 160 da SBDI-1 e OJ 251 da SBDI-1, todas do TST.
35 O Supremo Tribunal Federal definiu que os honorários advocatícios sucumbenciais ostentam natureza jurídica alimentar, consoante Súmula Vinculante 47: “Os honorários advocatícios incluídos na condenação ou destacados do montante principal devido ao credor consubstanciam verba de natureza alimentar cuja satisfação ocorrerá com a expedição de precatório ou requisição de pequeno valor, observada ordem especial restrita aos créditos dessa natureza”. (DJE 02.06.2015). Em igual sentido o art. 85, § 14, do CPC: “Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial”.
36 Por todos: “Processual Civil. Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial. Execução de Honorários Advocatícios. Penhora. Verba Alimentar. Exceção. Possibilidade. Decisão Mantida. 1. "A jurisprudência desta Corte Superior consolidou o entendimento no sentido de que o caráter absoluto da impenhorabilidade dos vencimentos, soldos e salários (dentre outras verbas destinadas à remuneração do trabalho) é excepcionado pelo § 2o do art. 649 do CPC de 1973 (atual art. 833, § 2o, do CPC de 2015), quando se tratar de penhora para pagamento de prestações alimentícias" (AgInt no AREsp 1.107.619/PR, rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4a T., j. 16.11.2017, DJe 22.11.2017). 2. Agravo interno a que se nega provimento”. (STJ – 4a T. – AgInt no AREsp 1.209.653 – rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – DJE 28.08.2018).
37 Por todos: “Recurso Ordinário em Mandado de Segurança. Penhora incidente sobre honorários médicos recebidos pelo impetrante. Legalidade. Artigo 833, § 2o, do CPC/2015. Na presente hipótese, a ilegalidade apontada é a decisão judicial proferida na reclamação trabalhista de origem, que determinou o bloqueio dos créditos do executado, ora impetrante, até atingir o valor total da execução, qual seja R$ 37.971,78. Observe-se, no caso, que a decisão combatida foi prolatada em 8/5/2017, portanto, na vigência do CPC/2015. Nesse contexto, cumpre assinalar o que preceitua o § 2o do art. 833 do citado Código: O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8o, e no art. 529, § 3o. Assim, verifica-se que o inadimplemento de prestações alimentícias “independentemente de sua origem” enseja penhora de salários e proventos no limite estabelecido na novel lei processual. Note-se que a expressão destacada não existia no CPC de 1973 e, por essa razão, esta Corte Superior consagrou o entendimento segundo o qual a exceção do revogado art. 649, § 2o, do CPC/1973 fazia referência apenas à prestação alimentícia fixada com espeque no art. 1.694 do CC/2002. Por fim, ressalte-se que o Tribunal Pleno dessa Corte Superior alterou a redação da Orientação Jurisprudencial n. 153 da SBDI-2/TST (Res. 220/2017, DEJT 21, 22 e 25.09.2017) para deixar claro que a diretriz ali contida aplica-se apenas a penhoras sobre salários realizadas quando ainda em vigor o revogado CPC de 1973, o que não se verifica na espécie. Destarte, não se há de falar em afronta a direito líquido e certo da impetrante, tampouco em violação de dispositivo de lei. Dessa forma, conclui-se que a decisão impugnada não merece reparos. Recurso ordinário conhecido e não provido. (TST – SDI2 – RO 21601-36.2017.5.04.0000 – rel. Min. Maria Helena Mallmann Atualização – DEJT 07.12.2017).
38 STJ – Corte Especial – EREsp 1.582.475 – Red. p/ ac. Mina Nancy Andrighi – j. 03.10.2018.
39 Comentários aos artigos 791 a 798 da CLT, 2018. p. 584.
40 Em consulta, no dia 05.10.2018, observa-se no andamento processual que os autos se encontram conclusos ao Ministro Luiz Fux, em razão de pedido de vista regimental, estando o julgamento empatado: “Decisão: Após o voto do Ministro Roberto Barroso (Relator), julgando parcialmente procedente a ação direta de inconstitucionalidade, para assentar interpretação conforme a Constituição, consubstanciada nas seguintes teses: “ 1. O direito à gratuidade de justiça pode ser regulado de forma a desincentivar a litigância abusiva, inclusive por meio da cobrança de custas e de honorários a seus beneficiários. 2. A cobrança de honorários sucumbenciais do hipossuficiente poderá incidir: (i) sobre verbas não alimentares, a exemplo de indenizações por danos morais, em sua integralidade; e (ii) sobre o percentual de até 30% do valor que exceder ao teto do Regime Geral de Previdência Social, mesmo quando pertinente a verbas remuneratórias. 3. É legítima a cobrança de custas judiciais, em razão da ausência do reclamante à audiência, mediante prévia intimação pessoal para que tenha a oportunidade de justificar o não comparecimento, e após o voto do Ministro Edson Fachin, julgando integralmente procedente a ação, pediu vista antecipada dos autos o Min. Luiz Fux. Ausentes o Min. Dias Toffoli, neste julgamento, e o Min. Celso de Mello, justificadamente. Presidência da Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 10.5.2018.” Acessível em: <[http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5250582].
41 Ao retrocedermos na análise das fontes materiais dos direitos fundamentais, previstos na Constituição de 1988, de acesso à justiça e de assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados, encontraremos a inspiração do nosso constituinte originário na Constituição Portuguesa de 1976, cujos dispositivos são ainda mais claros em revelar a axiologia que inspira a positivação dos direitos, qual seja, a de que a insuficiência econômica jamais seja um entrave para acessar o Poder Judiciário. Do art. 20o, 1, dessa Carta, extrai-se que: “A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios econômicos”.
42 Ressalve-se, aqui que, por se tratar de crédito de natureza jurídica tributária, especificamente de taxa judiciária (art. 145, II, da Constituição c/c art. 77 do CTN), tendo a União no polo ativo da relação obrigacional, a atuação em sede de execução deverá ser impulsionada pelo Órgão Jurídico de representação da União.
43 Ibidem, p. 101.
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André Araújo Molina
Professor Titular da Escola Superior da Magistratura Trabalhista de Mato Grosso (ESMATRA/MT), Professor Visitante da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (ENAMAT), Professor Visitante do Centro de Ensino e Aperfeiçoamento de Assessores e Servidores do Tribunal Superior do Trabalho (CEFAST/TST), Professor Visitante em diversas Escolas Judiciais dos Tribunais Regionais do Trabalho, Doutor em Filosofia do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), Mestre em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Castelo Branco (UCB/RJ), Especialista em Direito do Trabalho pela Universidade Castelo Branco (UCB/RJ), Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e Juiz do Trabalho Titular na 23ª Região (Mato Grosso). Tem experiência na área do Direito, atuando principalmente nos seguintes temas: Pós-positivismo, Direitos Fundamentais, Teoria do Direito, Precedentes Judiciais, Responsabilidade Civil e Acidente do Trabalho. Contato: aamolina@bol.com.br
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